Ultima atualização em 18 de Junho de 2020 às 10:47
Um estudo realizado pela Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), Embrapa Amazônia Oriental e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) demonstrou que florestas primárias são mais resistentes ao fogo do que aquelas que têm histórico de extração seletiva de madeira. No mês do meio ambiente, o artigo “Resiliência da floresta a incêndios na Amazônia Oriental depende das condições anteriores ao fogo” (título traduzido para o português) foi publicado na revista Forest Ecology and Management. A publicação reúne pesquisadores de instituições de pesquisa do Brasil e Estados Unidos e é oriunda do Programa de Pós-Graduação Sociedade, Natureza e Desenvolvimento (PPGSND) da Ufopa.
O manejo florestal difere da exploração predatória de madeira, permitindo retirada legal de árvores de maior porte (com diâmetro acima de 50 cm) a partir de um ordenamento da floresta para que haja a menor perturbação possível, como explica o professor João Ricardo Gama, que orientou o estudo: “Manejar a floresta consiste em colher, de forma planejada, parte do estoque de um produto, para a obtenção de benefícios econômicos e sociais, conservando os serviços ecossistêmicos”.
A pesquisa foi realizada na Floresta Nacional do Tapajós, no Oeste do estado do Pará, em uma área de floresta nativa atingida por um incêndio acidental em 1997. Antes e após o incêndio, foram comparadas áreas de floresta primária (aquelas sem histórico recente de perturbações) e áreas submetidas ao manejo florestal, onde há extração seletiva de madeira desde 1982.
Mesmo que exploradas conforme previsto pela legislação brasileira, os resultados da pesquisa demonstraram que as áreas de manejo ainda são menos resistentes ao incêndio do que as florestas nativas sem histórico de perturbação. Nas florestas manejadas, a recuperação é mais lenta porque as árvores de maior porte são extraídas para a comercialização, o que altera a dinâmica natural das florestas, com aumento nas taxas de mortalidade e de surgimento de novas árvores. O incêndio, ao atingir essas áreas, intensifica essa dinâmica, principalmente entre as árvores de pequeno porte.
Segundo o estudo, a área sem histórico de distúrbios conseguiu, em até 15 anos após a queima, estabilizar sua dinâmica natural de mortalidade e surgimento de árvores na floresta. “Em geral, o incêndio florestal de baixa e média intensidade aumenta a mortalidade de árvores pequenas, aquelas com menos de 20 cm de diâmetro, e intensifica o processo de regeneração natural da floresta, ou seja, aumenta a presença de novas árvores”, explica Dárlison Andrade, autor principal da publicação.
As perdas florestais nas áreas manejadas também são maiores. Um dos fatores que pode contribuir para isso é a maior quantidade de matéria orgânica seca no solo, resultante do aumento da mortalidade das árvores após a extração de madeira, funcionando como “combustível” para o fogo. A proximidade a pastos e terras cultiváveis também torna as florestas especialmente vulneráveis aos incêndios, já que o uso do fogo para preparar terrenos é comum na Amazônia.
“Os danos causados pelo fogo em áreas com histórico de extração seletiva de madeira, mesmo quando submetidas às diretrizes de redução de impacto de um plano de manejo florestal, são maiores do que em florestas primárias, e, por isso, o tempo de recuperação pode ser maior do que 15 anos, dependendo das condições de estrutura da floresta no momento do incêndio”, afirma Dárlison.
De acordo com o professor João Ricardo Gama, essa perda pode ser progressiva: “Dependendo da intensidade do fogo, a floresta manejada resiste a um primeiro incêndio; mas se for recorrente, os mecanismos de resiliência do ecossistema podem ser comprometidos, ou seja, sua capacidade de recuperação vai diminuindo na medida que novos incêndios atingem a floresta”.
Por isso, além da extração planejada de madeira, Dárlison Andrade reforça que é necessário o monitoramento e proteção das áreas manejadas diante de um cenário de aumento dos incêndios florestais na região, e, em alguns casos, pode ser necessária a aplicação de tratamentos silviculturais após o corte para beneficiar espécies de interesse: “São necessárias medidas adicionais de proteção às florestas, após a colheita de madeira, considerando que o ciclo de corte pode durar até 35 anos e que ainda não existe um sistema silvicultural pós-colheita estabelecido por lei, deixando a floresta sem tratamento e sob risco de incêndios. […] É imprescindível que no tempo de intervalo entre as colheitas de madeira, a floresta seja, de fato, alvo de ações de monitoramento e de proteção, caso contrário ficará vulnerável aos incêndios florestais, principalmente em épocas de grandes eventos de seca, como em anos de ocorrência do fenômeno El Niño”.
“Neste cenário, nosso estudo levanta questões importantes quanto à recuperação pós-fogo de florestas manejadas, buscando melhorar ainda mais esta importante atividade produtiva, mas precisamos destacar que parte considerável das florestas da Amazônia foi ou está sendo alvo de extrações ilegais e predatórias de madeira, tornando florestas nativas extremamente vulneráveis aos incêndios florestais”, complementa o pesquisador.
O artigo ficará disponível para download gratuito até o dia 25 de julho de 2020. Clique aqui para acessar.
Comunicação/Ufopa
17/6/2020