Ultima atualização em 5 de Fevereiro de 2021 às 10:02
Análise revela elementos da identidade amazônica de ontem e de hoje.
Publicado no Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, dossiê contempla análises de uma estética amazônica que, encontrada em objetos arqueológicos, persiste.
Com o escrutínio de iconografia arqueológica, pesquisadores revelam a complexidade amazônica através dos tempos. As pesquisas interpretam o que populações ancestrais queriam comunicar nas representações de elementos físicos e visuais encontradas em objetos diversos.
Autores no dossiê Arte, arqueologia e agência na Amazônia se valem de elementos figurativos e imagens presentes em objetos arqueológicos como elementos de fundamento na interpretação do modus vivendi e das visões de mundo de populações pretéritas. Exercício inerente à arqueologia, nesse conjunto de artigos, no entanto, as interpretações se pautam nos elementos estéticos.
Com autores vinculados à Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), o dossiê traz o artigo intitulado “A paisagem e as cerâmicas arqueológicas na bacia Trombetas: uma discussão da Arqueologia Karaiwa e Wai Wai", de autoria da professora Camila Jácome, docente do Programa de Arqueologia e Antropologia (PAA) da Ufopa, e de Jaime Xamen Wai Wai, egresso do curso de Arqueologia da Ufopa e atualmente mestrando em Antropologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
De acordo com Camila, o artigo é resultado de pesquisas que representam um encontro de duas perspectivas, a de um arqueólogo indígena e a de uma arqueóloga branca não indígena. “É um trabalho em que tentamos colocar as falas dos próprios indígenas para repensar algumas perspectivas da arqueologia, como a interpretação de cerâmicas arqueológicas, que é o caso da cerâmica Konduri. O que nós pudemos perceber é que, para os Wai Wai, além de outros povos que habitam a região do rio Trombetas, esse tipo de cerâmica está relacionado com o xamanismo, com a comunicação que os xamãs (espécies de “curadores” indígenas) utilizavam em suas práticas xamãnicas”, explica a docente.
O dossiê também conta com o artigo "Os discos perfurados do período Tapajônico: análise tecnológica e questões contextuais", de autoria de Claide Moraes, também professor do PAA da Ufopa, em coautoria com Mayara Sá, aluna de Arqueologia da Ufopa, e com o pesquisador Márcio Amaral, do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá.
Arqueologia, antropologia da arte e etnologia
Do Marajó ao rio Napo, que nasce nos Andes equatorianos, com uma proposta de integração da arqueologia com a antropologia da arte e a etnologia, as contribuições exploram diversos suportes, desde peças de vestuário, como as tangas e outros adornos, até urnas funerárias.
Para esses pesquisadores e pesquisadoras, lançar mão dos elementos físicos e dos recursos de imagem presentes nos objetos arqueológicos é revelador de "práticas cotidianas e rituais que envolvem a produção, a utilização e o descarte destes materiais", dizem os organizadores Erêndira Oliveira, Emerson Nobre e Cristiana Barreto no texto de apresentação.
Em onze artigos, os autores discutem a produção material em várias proposições estéticas que em seu conjunto apontam identidade. De acordo com os organizadores, eles e outros autores, com contribuições no volume, se utilizaram de "universos estéticos da Amazônia antiga em diferentes contextos e a partir de distintos materiais".
Nessa contribuição, os cientistas informam que buscaram na cultura material inspiração para expor "a circulação dos artefatos arqueológicos no presente e suas formas de ressignificação". De acordo com o referencial por que se pautaram, os objetos são "veículos de comunicação, negociação e reprodução cultural" e, ao se constituírem em arte, são capazes de mobilizar socialmente, de acordo com o pensamento de Alfred Gell. É deste antropólogo britânico o conceito de "tecnologia do encanto", um sistema técnico composto pelas diversas artes. "Nessa perspectiva, objetos de arte seriam fruto de uma atividade técnica de transubstanciação engenhosa de materiais e das ideias a eles associados", informam Hélio Menezes e Rafael Hupsel no verbete "Arte – Alfred Gell" na Enciclopédia de Antropologia da Universidade de São Paulo (USP).
Contribuições indígenas e uma abordagem decolonial constam dos artigos que compõem o dossiê, em interpretações sobre os processos de manufatura e aspectos utilitários de objetos. Ao final, três artigos tratam das apropriações e ressignificações de objetos e imagens na atualidade.
A íntegra da apresentação ao dossiê pode ser vista em:
OLIVEIRA, Erêndira; NOBRE, Emerson; BARRETO, Cristiana (2020). Arte, Arqueologia e agência na Amazônia. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, 15(3), e20200111. Epub November 13, 2020.
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Texto: Jimena Felipe Beltrão, jornalista e editora do Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, com contribuição de Renata Dantas (Comunicação/Ufopa).