Criado em 3 de Fevereiro de 2020 às 15:02
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3 de Fevereiro de 2020 às 15:02
OESTE DO PARÁ - Recente pesquisa comprovou que características ecológicas das comunidades de peixes são afetadas pela proximidade e pelo tamanho populacional de cidades amazônicas. O estudo teve amostras de 48 lagos de cinco trechos de grandes rios da Amazônia brasileira: rio Tocantins, rio Tapajós, rio Amazonas, rio Negro e rio Solimões. O resultado da pesquisa foi divulgado em artigo científico publicado em revista internacional.
O estudo foi conduzido por pesquisadores de cinco universidades brasileiras e uma norte-americana. As universidades brasileiras que participaram do estudo são, em sua grande maioria, públicas, sendo duas do estado do Pará, Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) e Universidade Federal do Pará (UFPA); duas do Rio Grande do Sul, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos); e uma de São Paulo, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A universidade estrangeira participante foi a Texas A&M University, instituição pública sediada na cidade de College Station, no estado do Texas, nos Estados Unidos.
Pela Ufopa, participou da pesquisa o professor Gustavo Hallwass, do Campus de Oriximiná, que coordena o Laboratório de Ecologia Humana, Peixes, Pesca e Conservação (LEHPPEC). Ele foi um dos idealizadores do trabalho, junto com Friedrich W. Keppeler, professor da universidade norte-americana, e com o coordenador da pesquisa, o professor Renato A. M. Silvano, da UFRGS. A pesquisa compilou dados de projetos de pesquisa realizados entre os anos 2000 e 2013 e teve o objetivo de verificar os efeitos da pressão pesqueira, oriunda da demanda de peixes dos grandes centros populacionais da região amazônica, em diversas variáveis ecológicas das comunidades de peixes da região.
Gustavo Hallwass, que trabalha há mais de 10 anos com a pesca na região amazônica, afirmou que “para quem conhece a região amazônica e trabalha com peixes e pesca, é clara a pressão sobre estoques pesqueiros, principalmente próximo a grandes centros urbanos”. Assim, a pesquisa investigou e descobriu a influência da proximidade e do tamanho populacional das cidades amazônicas sobre diversas características ecológicas analisadas nas comunidades de peixes.
Principais resultados da pesquisa
Os autores da pesquisa demonstraram que, quanto mais distante das cidades, maiores e mais pesados são os peixes, indicando forte pressão pesqueira e diminuição dos estoques próximos aos centros urbanos. Outro resultado importante relacionou a distância entre o lago e o canal principal do rio à captura por unidade de esforço (CPUE), isto é, quanto mais longe do canal do rio, maior é a CPUE das capturas, indicando a acessibilidade como um fator que influencia na pressão pesqueira e na redução dos estoques.
No rio Tapajós foram pesquisados 11 lagos, localizados em comunidades da Floresta Nacional do Tapajós, Reserva Extrativista, Alter do Chão e Ponta de Pedras, além do lago do Juá, próximo ao aeroporto de Santarém. No rio Amazonas, foram quatro lagos: Água Preta, Costa do Aritapera, Ilha Grande e Mamauru. Na região do Baixo Amazonas paraense, a pesquisa envolveu os municípios de Santarém, Belterra, Óbidos e Monte Alegre.
Outros municípios envolvidos foram Baião, no rio Tocantins, com pesquisa em 12 lagos, Barcelos e Uarini, no estado do Amazonas, com 7 e 14 lagos, respectivamente.
Necessidade de áreas protegidas
No artigo, os autores argumentam que os peixes fornecem diversos serviços ecossistêmicos, desde dispersão de sementes e ciclagem de nutrientes até provisão de alimento e renda para a população ribeirinha que depende desse recurso natural. Portanto, tornam-se fundamentais medidas de manejo e conservação dos recursos pesqueiros, principalmente próximo a grandes centros urbanos, com o objetivo de garantir a segurança alimentar e econômica de populações humanas, bem como manter as populações de peixes e todo o ecossistema aquático e terrestre adjacente.
Assim, os autores sugerem a possibilidade de estabelecimento de áreas protegidas próximo aos grandes centros; o apoio a programas de comanejo pesqueiro, onde as regras de gestão dos recursos são oriundas dos próprios pescadores; e/ou uma combinação de medidas tradicionais de gestão pesqueira, visando garantir o respeito às regras e manter as necessidades financeiras dos pescadores. Além disso, os autores argumentam que apenas com o apoio e entendimento dos pescadores e o respeito à atividade do pescador, aliados ao monitoramento e fiscalização, é possível garantir a manutenção e conservação dos estoques pesqueiros e os serviços ecossistêmicos associados.
“As áreas protegidas, e as outras formas de gestão sugeridas, como o comanejo e combinação de medidas tradicionais de manejo, são propostas que visam reduzir a pressão pesqueira próximo aos centros urbanos. Sem gestão nenhuma, o que pode ocorrer é a sobre-explotação dos recursos pesqueiros, pois, de acordo com os resultados obtidos, os peixes capturados próximo às cidades são menores, assim a atividade pesqueira pode passar a capturar peixes abaixo do tamanho reprodutivo, levando ao esgotamento dos estoques”, disse professor Gustavo Hallwass.
Considerando essa realidade, os pescadores teriam que ir cada vez mais longe para capturar peixes de tamanhos maiores para manter a produção, o que acarretaria o ônus de aumento de custos de produção, incluindo todos os impactos ambientais associados. “Dessa maneira, a sugestão de áreas protegidas está relacionada à redução do esforço de pesca em determinadas áreas, garantindo a reprodução dos peixes e a manutenção dos estoques pesqueiros. Áreas protegidas podem ser áreas fontes de peixes, mantendo os tamanhos populacionais locais. Propostas de áreas protegidas com o intuito de manter os estoques são amplamente difundidas no ambiente costeiro e marinho”, acrescentou.
O artigo
O artigo científico foi publicado na revista Aquatic Conservation: Marine and Freshwater Ecosystems, que publica estudos internacionais relacionados à conservação de ecossistemas aquáticos marinhos e de água doce. A revista possui um fator de impacto de 3,13 e é qualificada no estrato A2 da área de Biodiversidade da Capes. O trabalho pode ser encontrado no seguinte link: Aquatic Conservation: Marine and Freshwater Ecosystems
Sobre Gustavo Hallwass
É professor do Campus da Ufopa em Oriximiná, coordenador do Laboratório de Ecologia Humana, Peixes, Pesca e Conservação (LEHPPEC). Atua em linhas de pesquisa voltadas para o uso e conhecimento tradicional sobre os recursos naturais por populações humanas, ecologia de peixes e dinâmica da atividade pesqueira. Busca integrar diferentes métodos científicos e áreas de conhecimento no manejo e conservação de recursos naturais. O professor Gustavo Hallwass e o LEHPPEC também integram o grupo de pesquisa “Biodiversidade, Ecologia e Conservação de Organismos Neotropicais” (Becon), junto com outros cinco pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento, como Ecologia, Conservação, Botânica e Zoologia, envolvidos em pesquisas sobre organismos neotropicais, sobretudo os amazônicos.