Desculpe, o seu navegador não suporta JavaScript!

Criado em 18 de Abril de 2024 às 11:43

Discussão da ONU sobre desenvolvimento sustentável, em Santarém, não teve espaço para participação popular e é marcada por críticas

03/08/2023 - TAPAJÓS DE FATO - Ufopa citada

18 de Abril de 2024 às 11:43

Discussão da ONU sobre desenvolvimento sustentável, em Santarém, não teve espaço para participação popular e é marcada por críticas

 

O evento promovido pelo governo do estado no município, em conjunto com a ONU, contou também com lideranças dos movimentos sociais e dos sindicatos, após um embate que começou a ser travado nas redes sociais e mesmo com pouca abertura para a participação popular, os mesmos se fizeram presentes, afinal, as lideranças reivindicavam que não se podia fazer um evento que discute Amazônia sem aquelas e aqueles que travam batalhas em defesa da floresta em pé, como populações tradicionais, originárias e trabalhadores do campo e ativistas do movimento social da cidade.
03/08/2023 às 14h59Por: Damilly YaredFonte: Tapajós de FatoCompartilhe:Foto: Tapajós de Fato    Foto: Tapajós de Fato
O município de Santarém sediou, na quarta-feira (2) o evento “ONU e Amazônia: parceria para o desenvolvimento sustentável”, com a presença da vice-secretária-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Amina Mohammed, que ocorreu no Centro Convenções Sebastião Tapajós.

 

Além de Amina, o evento teve a participação dos governadores e representantes do Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável da Amazônia Legal, como o governador do estado do Pará, Helder Barbalho, Clécio Luís do Amapá, Antônio Denarium de Roraima, o prefeito de Santarém, Nélio Aguiar e o Ministro do Desenvolvimento Regional do Brasil, Waldez Góes.

 

O evento promovido pelo governo do estado no município, em conjunto com a ONU, contou também com lideranças dos movimentos sociais e dos sindicatos, após um embate que começou a ser travado nas redes sociais e mesmo com pouca abertura para a participação popular, os mesmos se fizeram presentes, afinal, as lideranças reivindicavam que não se podia fazer um evento que discute Amazônia sem aquelas e aqueles que travam batalhas em defesa da floresta em pé, como populações tradicionais, originárias e trabalhadores do campo e ativistas do movimento social da cidade.

 

O Tapajós de Fato conversou com Maria Ivete Bastos, atual presidente do Sindicatos do Trabalhadores e Trabalhadoras Agricultores e Agricultoras Familiares de Santarém (STTR), que ao ser questionada sobre a participação popular no evento, ressalta que: “a gente fica até muito triste e isso causa até um sentimento de revolta. Porque nós trabalhamos verdadeiramente a preservação, o desenvolvimento, produzimos alimento, alimento saudável e estamos aí fazendo esse enfrentamento constante com tudo aquilo que devasta a Amazônia. Então para nós, é muito importante e necessário esse momento para que a gente possa também expressar o nosso sentimento, daquilo que a gente pode estar falando, reivindicando para esta Amazônia”.

 

Para Cláudia Santana, presidente da  Federação das Associações de Moradores e Organizações Comunitárias de Santarém - Famcos, mesmo que os movimentos tenham sido chamados de última hora, “foi uma grande vitória, estarmos e adentrarmos a esse momento tão ímpar na Amazônia que é a vinda da vice-secretária da ONU, onde eles têm um trabalho muito voltado pra questão da melhoria da condição de vida das pessoas em especial propondo um modelo de desenvolvimento sustentável”.

 


Foto: Tapajós de Fato / Entrevistada: Maria Ivete Bastos

 

O governador do estado do Pará, exaltou a presença de Amina em território amazônico, bem como a participação dos governadores do consórcio da Amazônia Legal e das autoridades presentes no local, esquecendo-se de informar a Amina Mohammed sobre a presença dos movimentos sociais.

 

A crítica dos movimentos e lideranças contrapõe a fala inicial do governador Helder Barbalho na abertura do debate, quando ele ressaltou a importância da floresta e dos povos que vivem nela, pois sem a bioeconomia da Amazônia legal não há segurança alimentar, mas se para o governador do estado Pará a preocupação com os povos da floresta é real, por quê o debate não foi aberto ao público?

 

O evento realizado no município, marcou o lançamento do Fundo Brasil-ONU para o desenvolvimento sustentável, que segundo Amina Mohammed, servirá para a “transição para uma economia verde, reduzindo o desmatamento em 2030 ou antes, e para investir nas pessoas e na terra como um todo”, visto que sua história em seu país de origem a Nigéria, se complementa a história dos amazônidas, sobre cuidar dos rios e da terra. Este fundo deverá financiar propostas de desenvolvimento humano e econômico da região amazônica, em harmonia com a floresta. 

 

Santarém e o desenvolvimento sustentável

 

Manifestação através de cartaz dos movimentos sociais / Foto: Tapajós de Fato
 

A luta dos trabalhadores do campo, dos indígenas, dos quilombolas e dos agroextrativistas na nossa região em defesa da floresta e contra os grandes projetos é reconhecida, a novidade no evento da ONU foi a participação e o interesse repentino do gestor municipal, Nélio Aguiar, que esteve na comitiva de boas vindas á nigeriana Amina Mohammed.

 

Recentemente o prefeito Nélio Aguiar tem participado de debates que pautam o desenvolvimento sustentável, o que seria de grande interesse da população, acontece que a contradição começa quando em 6 anos gerindo o município de Santarém, o prefeito tem seu governo marcado por diversas polêmicas no que diz respeito a preservação do meio ambiente, como é o caso do Plano Diretor do município que teve alterações depois da votação e mesmo assim foi aprovado pelo gestor, plano este que permite a construção de portos em áreas de preservação, como a do Lago do Maicá, que afetará a atividade pesqueira, o estilo de vida e a permanência de diversas famílias.

 

Entrevista com o prefeito de Santarém, Nélio Aguiar / Foto: Tapajós de Fato
 

Ao ser questionado pela equipe do Tapajós de Fato sobre seu interesse recente pelo meio ambiente após a aprovação da construção dos portos no Maicá, Nélio Aguiar afirmou que “tem buscado trabalhar o dialógo". E que para ele é preciso fazer esse diálogo buscando justamente o desenvolvimento sustentável, de uma forma que tenha sustentabilidade, “e que você precisa preservar produzindo, e produzir, preservando”. 

 

O gestor municipal, finaliza a entrevista dizendo que, “Santarém tem uma localização privilegiada geograficamente, então a gente tem um potencial muito grande em termos de área portuária, e área portuária no Rio Amazonas, ela é importante para que a gente possa, inclusive, aumentar as receitas do município e com isso a gente poder atender melhor o nosso território. E até mesmo as aldeias, nosso território é muito grande, são 18 mil km², tem uma demanda de receita muito grande pra isso”. 

 

Diante do que o evento da ONU se propôs a debater na cidade, conversamos com a Reitora da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), Aldenize Xavier, que enxerga que a universidade precisa estar presente nessas discussões, pois ela acredita que a universidade “pode apontar caminhos que de fato a gente siga para apoiar nossa população, e trazer conhecimento, trazer renda com a nossa floresta em pé, cuidando dos nossos rios, que é o que o mundo todo precisa, não só a Amazônia”. 

 

Aldenize Xavier acredita ainda que a Ufopa já tem feito esse debate, sobre o desenvolvimento sustentável, e as mudanças climáticas que é o assunto mais emergente, de acordo com a gestora da universidade, “toda pesquisa desenvolvida na universidade, pensa a Amazônia de forma sustentável, produz conhecimento, estuda os nossos indicadores, pensando no que é melhor pra nossa região”, desta forma, “a universidade é um órgão estratégico, porque tem condição e já tem feito ao longo dos anos essa ponte entre nós povos tradicionais, a ciência e o desenvolvimento”.

 

Apesar da fala importante da gestora da universidade, ao final do evento, Aldenize Xavier se pronunciou nas redes sociais afirmando que “a universidade não foi ouvida e não pôde submeter propostas ao fundo”. E reforça que os governantes “continuam cometendo os mesmos equívocos, mesmo com a Amazônia em pauta”. E questiona “quem são os atores? Que Amazônia está em pauta, uma vez que não há modelo de desenvolvimento sustentável de cima para baixo que nos sirva se feito por nós e conosco”. 

 

Para muitos presentes a discussão da Amazônia no evento foi rasa, uma vez que ele foi organizado para uma parcela específica da sociedade que de fato não representa quem luta e morre pela floresta, diante disso, o Padre Edilberto Sena, liderança do Movimento Tapajós Vivo (MTV), iria entregar para Amina Mohammed uma carta. De acordo com o Edilberto Sena, “a nossa carta é uma preocupação de que um encontro como esse, com uma representante da ONU aqui na nossa região, que ela saia daqui sabendo que nós temos graves problemas porque o nosso território está em disputa, e é uma disputa entre o capital e os que querem viver o bem viver”.

 

Para o padre, a disputa ainda aumenta quando o governador do estado, Helder Barbalho, debate a ferrogrão em outros eventos, e fala no evento com a ONU sobre o desenvolvimento sustentável, visto que o movimento se coloca totalmente contra a construção dessa ferrovia, bem como das atividades de garimpo e dos portos graneleiros no rio Tapajós. Por isso, a carta levaria ao conhecimento da vice-secretária-geral da ONU a preocupação de que “se nós vamos trabalhar para o desenvolvimento sustentável, nós vamos trabalhar para salvar a Amazônia, nós não podemos ficar fazendo um jogo de queremos a salvação da Amazônia e ao mesmo tempo nos aliamos com quem tem permitido todas essas desgraças chegando na nossa região”.

 


 Carta para a vice-secretária geral da ONU - Amina Mohammed /     Foto: Tapajós de Fato

 

Durante a fala da representante da ONU, Amina Mohammed, já no segundo bloco de falas do evento, os movimentos sociais levantaram uma faixa na qual pediam “TAPAJÓS SEM FERROGRÃO. MEIO AMBIENTE GARANTIDO”, que é uma proposta do governo do estado, que tem feito inclusive acordos internacionais para construir a ferrovia que beneficiará apenas o agronegócio e destruirá centenas de comunidades que ficam ao longo de onde deverá ser construída a ferrovia.

 

O evento da ONU realizado em Santarém abre espaço para uma reflexão importante, a partir do dia 4 de agosto, os olhos do mundo estarão voltados para os acordos que acontecerão na Cúpula da Amazônia, em Belém, a capital paraense. Não estariam surfando no “desenvolvimento sustentável” gestores e pessoas interessadas apenas no dinheiro dos fundos e deixando fora do debate cientistas locais, povos tradicionais, povos originários e ativistas do clima? Afinal, as discussões atuais, agora que se está em um novo governo, são feitas por políticos que no governo anterior fizeram parte de acordos de destruição do meio ambiente, por negacionistas do clima.

 

Link: https://www.tapajosdefato.com.br/noticia/1196/discussao-da-onu-sobre-desenvolvimento-sustentavel-em-santarem-nao-teve-espaco-para-participacao-popular-e-e-marcada-por-criticas