Ultima atualização em 23 de Fevereiro de 2022 às 17:28
José Seixas Lourenço, reitor pro tempore da Ufopa
Criada pela Lei nº 12.085, de 5 de novembro de 2009, por desmembramento das unidades da Universidade Federal do Pará (UFPA) e da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), a Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) tem o objetivo de ministrar ensino superior, desenvolver pesquisa nas diversas áreas do conhecimento e promover a extensão universitária nesta vasta região da Amazônia.
Em plena construção, a Universidade recebeu em março 1.200 alunos, a primeira turma selecionada por processo seletivo que adotou integralmente as notas do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), ingressando em estrutura acadêmica inovadora.
Em entrevista ao Beira do Rio, o reitor pro tempore da UFOPA, Prof. José Seixas Lourenço, ex-reitor da UFPA, ex-diretor do Museu Paraense Emílio Goeldi e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), fala sobre o desafio de implantar a primeira universidade federal no interior da Amazônia.
BR – Como surgiu a proposta de criação da UFOPA?
José Seixas Lourenço: O projeto inicial de implantação da UFOPA, com atuação multicâmpi e sede em Santarém (PA), foi entregue ao ministro da Educação, Fernando Haddad, por ocasião da solenidade de celebração dos 50 anos da UFPA, em julho de 2007. A proposta recebeu, de imediato, a adesão da comunidade científica nacional.
Outro fator que contribuiu para a sua criação foi a disposição do governo federal em expandir a rede de ensino superior e ampliar os investimentos em Ciência e Tecnologia. A criação da UFOPA, com desmembramento da UFPA e da UFRA, atende a esses propósitos e também às demandas de uma região com economia e cultura peculiares.
BR – O que a sociedade pode esperar dessa Universidade? Qual o seu diferencial?
José Seixas Lourenço: O objetivo maior da criação da UFOPA é a construção da cidadania por meio de produção de conhecimento, inovação tecnológica, soluções sociais inovadoras (fomento de ideias) e formação de recursos humanos qualificados, ou seja, quadros profissionais competentes a serviço da sociedade. A UFOPA tem por princípio a relevância social traduzida, por um lado, em formar e pesquisar por meio do engajamento social do trabalho acadêmico. A formação de nível superior, para estar comprometida, de fato, com o desenvolvimento regional, não pode ficar confinada às salas de aula, aos laboratórios, nem aos muros dos campi. O contato orientado do aluno com a realidade circundante é a verdadeira pedagogia, o que tem inspirado o conteúdo curricular dos cursos e das demais atividades acadêmicas da nova universidade.
BR – Quais foram as prioridades do primeiro ano da Universidade?
José Seixas Lourenço: Em primeiro lugar, a criação do Conselho Consultivo da UFOPA, com representantes de diferentes segmentos da sociedade, em respeito ao princípio da gestão democrática do ensino público. Em seguida, a consolidação da nova estrutura acadêmica, que vinha sendo elaborada desde 2008 pela Comissão de Implantação da Universidade, criada pelo MEC e presidida por mim. Alvo de muitas discussões abertas à comunidade, o modelo acadêmico da UFOPA estrutura-se nos princípios da inovação, interdisciplinaridade, flexibilidade curricular e formação em ciclos, visando à educação continuada. Entre as conquistas, está o primeiro processo seletivo, utilizando exclusivamente o ENEM, com 17.585 inscritos.
Isto comprova a aceitação do novo modelo acadêmico. Outro ponto fundamental foi a fixação de profissionais qualificados. Com a realização de concursos, triplicamos, em apenas um ano, o efetivo de docentes e de técnicos. A estruturação dos nossos campi em Santarém foi outra prioridade. Conseguimos a incorporação da área da SUDAM ao Campus Tapajós, que agora conta com 16 hectares, e estamos investindo mais de R$ 10 milhões em obras, como a construção de dois grandes prédios que abrigarão laboratórios e salas de aula.
BR – Na década de 80, quando era reitor da UFPA, o senhor deu início ao processo de interiorização da Universidade no Estado, na época, uma experiência inovadora. A criação da UFOPA está ligada a esse processo ou é algo independente?
José Seixas Lourenço: Sim, entendo que a UFOPA está ligada à necessidade de ampliação da oferta de vagas no interior da Amazônia. Em 1985, assumi a Reitoria da UFPA e, já no ano seguinte, demos início ao ousado projeto de interiorização com a criação de oito campi em cidades do interior. Naquela época, não tínhamos apoio federal e fomos muito criticados por diversos setores da Instituição.
Os cursos de licenciatura receberam muitos alunos que já atuavam como professores, o que resultou numa significativa melhoria na qualidade da educação. Enfim, considero que a UFOPA é, sem dúvida, o fruto que amadureceu mais rapidamente com o processo de interiorização da UFPA.
BR – Uma das propostas da Universidade é o investimento em pós-graduação. Como estão as perspectivas nesta área para 2011?
José Seixas Lourenço: Consideramos a pós-graduação absolutamente essencial. Em março de 2009, antes da criação oficial da UFOPA, a Universidade já tinha um Mestrado em Recursos Naturais da Amazônia, que, hoje conta com 30 alunos. Recentemente, a CAPES aprovou o Mestrado em Matemática, que já conta com mais de 300 candidatos inscritos para 15 vagas. A aula inaugural está marcada para o dia 2 de abril próximo. Estimulados pela CAPES, já encaminhamos novas propostas de criação de mestrados nas áreas de Águas e Florestas, além de uma proposta de doutorado interinstitucional em Sociedade, Natureza e Desenvolvimento. Temos, também, pelo menos cinco cursos de especialização implantados ou em fase de implantação.
BR – Mesmo estando em pleno funcionamento, a UFOPA ainda está em construção. Quais as perspectivas em termos de infraestrutura?
José Seixas Lourenço: Primeiro, completar os investimentos iniciados em 2010, como as construções do prédio que abrigará o Instituto de Ciências da Educação no Campus Rondon, e do Centro de Formação Interdisciplinar, no Campus Tapajós. Estão previstos para 2011 mais de 36 milhões em investimentos, cujas prioridades serão a construção do Centro de Tecnologia da Informação e Comunicação (CTIC) e a Biblioteca Central, ambos no Campus Tapajós.
BR – O que o senhor tem a dizer sobre as críticas que o modelo acadêmico da UFOPA recebe?
José Seixas Lourenço: O novo modelo acadêmico visa atender aos interesses maiores da sociedade e seu futuro, e não aos corporativismos internos ou às receitas ideológicas ultrapassadas. Isto exige muito mais criatividade dos professores, pois se trata de conceber o “novo”, mais que a transposição dos modelos de formação já vigentes, muitas vezes inadequados à realidade social regional. Deveríamos nos inspirar nos versos de Fernando Pessoa: “Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo. E esquecer os nossos caminhos que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia. E se não ousarmos fazê-la, teremos ficado para sempre à margem de nós mesmos.”
Portanto, mudança é travessia e, no contexto da nossa nova universidade, exige, além da ousadia, um percuciente olhar rumo às novas gerações numa perspectiva amazônica.